sábado, 22 de novembro de 2008

Jornal O Globo

E AS AÇÕES DA VALE, HEIN?

- Os novatos compradores de ações no seu primeiro crash -

Outro dia, estava no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, à procura de um celular perdido. Atendeu-me um funcionário, muito prestativo, que fez o possível mas não localizou o aparelho. Paciência - disse ele. Agradeci, já estava deixando a sala, quando ouço: “desculpe, mas e as ações da Vale, hein?”

Voltei e ouvi sua história. Ele e sua mulher haviam aderido ao programa que permitiu utilizar parte do FGTS para comprar ações da Vale. Colocaram, na ocasião, algo como R$ 8 mil (números aproximados, cito de memória). E tinham, no dia da nossa conversa, pouco mais de R$ 20 mil.
Perguntei se havia feito a conta de quanto teriam se o dinheiro tivesse ficado no FGTS. Bem informado, o funcionário respondeu na hora: uns R$ 9 mil e pouco.

Portanto, continua sendo um bom negócio, comentei.

E ele: é, mas a gente tinha R$ 35 mil.

Esse é o sentimento que prevalece. A pessoa incorpora o dinheiro valorizado, passa a ser seu, entra nos planos da família. De repente, desaparece.

Por toda parte que ando, essa é a pergunta dominante: e a Bolsa? Recupera quando?
Isso mostra como cresceu o número de brasileiros que “entraram na Bolsa”. Isso decorreu, de um lado, de uma campanha bem sucedida de popularização (ou democratização) da Bolsa, como dizia seu presidente, Raimundo Magliano.

Multiplicaram-se os clubes de investimentos, home brokers e os fundos, com acesso a partir de 100, 200 reais.

De outro lado, reformas legais ampliaram o mercado de capitais no Brasil. Inúmeras empresas abriram seu capital, de modo que o processo fechou. Mais investidores entrando, mais papéis sendo oferecidos.

Em cima disso, veio a euforia. O índice Bovespa, que chegou a passar dos 70 mil pontos, parecia não ter limite. Quem não estava na Bolsa, fatalmente encontrava um amigo, um familiar, animadíssimo com a força de seus investimentos. Difícil não entrar também.

Hoje, há situações diferentes. Uns, como o de nosso funcionário de Congonhas, pegaram a coisa lá de baixo, ainda podem contabilizar alguma coisa no positivo. Outros entraram mais recentemente e hoje registram perdas de mais de 60%. Mas mesmo aqueles do primeiro grupo olham o quanto perderam em relação ao pico.

E parece que todos não acreditaram que a queda seria tão rápida e tão profunda. Tenho ouvido raríssimos relatos de pessoas que venderam tudo no começo da crise. E, de fato, os gestores profissionais informam que houve poucos saques.

Caíram todos em uma armadilha. É como se os investidores não tivessem tido tempo de reação. Foi a surpresa com a queda, depois um sentimento de que não pode cair tanto assim e agora, o que fazer? Sair e realizar um baita prejuízo? Ficar, na torcida de uma recuperação, e arriscar-se a perder mais ainda?

Dá para perceber um sentimento de que a Bolsa sempre se recupera. Todos se interessam muitíssimo pelos gráficos que mostram os picos e vales.

É que a Bolsa não pode dar prejuízo sempre, pois assim as empresas simplesmente chegariam ao fim e, com elas, o capitalismo. Como não se vislumbra nada parecido com isso, está claro que tendência longa deve ser de alta. E de fato, tomando-se o índice SP500, da Bolsa de Nova York, desde seu primeiro dia, somando mais de dois séculos, temos 70% dos anos com ganhos e 30% com perdas.

Olhando-se a história da Bovespa, também se verifica que picos são cada vez mais altos e os vales, cada vez menos baixos.

Ok, mas a questão chave está em outra variável, a que todo mundo pergunta: quanto tempo para recuperar?

E isso ninguém sabe. No momento, estamos conhecendo, pouco a pouco, o tamanho da recessão nos países ricos e da desaceleração nos emergentes. Ainda não dá para dizer quando isso acaba e o mundo recomeça a acelerar. E isso porque tudo depende, também, de um fator psicológico, a confiança.

Há hoje uma boa tecnologia de pesquisa para se avaliar o grau de confiança do momento, isso para consumidores, investidores e empresários. Aliás, está bem baixa hoje. Mas não há pesquisa que permita antecipar quando e como se recupera a confiança.

Resumo da ópera: estamos no momento de realização das perdas, material e subjetivamente. É a primeira vez que isso acontece por aqui depois da expansão da Bolsa. E logo com uma crise dessas.

Publicado em O Globo, 21 de novembro de 2008

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

A Semana em Análise

No final de semana houve a reunião do G-20 nos EUA para discutir o que fazer diante da crise. Houve avanços nas discussões, mas sem a participação do novo presidente americano Barack Obama, não havia como decidir alguma coisa. De qualquer forma, a renião mostrou que o G-7 sozinho não representa mais a força econômica mundial.

Uma das coisas que eles concoradaram foi não aumentar barreiras comerciais. Mas no dia seguinte a Argentina tomou medidas nesse sentido. Então nada é fácil em tempo de crise.

Ainda nesta semana, o Japão anuciou que estava em recessão, com dois trimestres consecutivos de queda no PIB. Alemanha, Itália e Zona do Euro já tinham anunciado. A crise está espalhando pelas economias ricas.

Outra assunto importante esteve rondando a indústria automobilística americana, que foi ao Congresso americano pedir dinheiro para enfrentar os problemas. Mas os presidentes foram de jatinho, gastando uma fortuna e isso provocou bastante discussão nos Estados Unidos. O Sardenberg sugeriu que eles deveriam ter ido de carro, e econômico para não gastar gasolina! Uma coisa que já falamos aqui no blog, é que o problemas dessas montadoras, GM, Chrysler e Ford, são muito anteriores à crise.

A deflação também virou um problema esta semana, com queda forte nos preços no atacado e também no varejo americano. A Inglaterra também teve queda nos preços e isso virou um novo fantasma para as economias ricas.

Aqui no Brasil tivemos queda forte nas vendas de veículos em novembro, mas a indústria ainda terminará o ano com recordes. As dúvidas ficam para o ano que vem, sobre o que acontecerá. O governo continou dando ajuda a setores, ao invés de pensar em medidas horizontais. Por que privilegiar carros e motocicletas, e não pensar em todos os setores?

Também tivemos a compra da Nossa pelo Banco do Brasil.

Enfim, mais uma semana daquelas!

A disputa na Bahia

Estava escrito nas estrelas. A chapa ia começar a esquentar na Bahia, assim que se proclamassem os resultados das eleições para a prefeitura de Salvador.

Pois desenrola-se na Bahia mais um emocionante capítulo da disputa pelo controle da política estadual e pela conquista do espólio de ACM.

O ministro Geddel Vieira Lima (PMDB) e o governador Jacques Wagner (PT) enfrentaram-se nas eleições para a prefeitura de Salvador.

O afilhado do governador, Walter Pinheiro (PT), perdeu para o afilhado do ministro, João Henrique (PMDB), que se reelegeu.

Agora, Geddel Vieira Lima quer que o PMDB baiano se afaste do governo. Para oficializar suas intenções, publicou artigo no jornal “A Tarde”, de Salvador, colocando à disposição do governador Jacques Wagner todos os cargos do PMDB na administração estadual.

O partido controla duas Secretarias poderosíssimas: Infra-Estrutura (especialmente útil no interior, por conta de obras e contatos com os prefeitos) e Indústria, Comércio e Mineração. Mas o PMDB está presente ainda em diretorias de empresas e autarquias.

Ora, até as pedras do calçamento do Pelourinho sabem que, quando o PMDB se dispõe a deixar algum cargo público (qualquer um), é porque está pintado para a guerra.

O governador, que está no exterior, ainda não se manifestou publicamente a respeito do artigo do ministro Geddel.

Mas a briga, que estava mantida em banho-maria até as eleições municipais, escancarou de vez e promete lances emocionantes.

Não podemos esquecer de que o Geddel Vieira Lima é ministro poderoso e um dos principais articuladores da aliança entre o PMDB e o governo Lula.

O outro contendor, Jacques Wagner, governa um estado importante e pode vir a ser o Plano B do PT, caso a candidatura da ministra Dilma Roussef não decole.

É briga de cachorro grande, que pode desabar no colo do presidente Lula, justo no momento em que o presidente está tentando articular a sucessão nas presidências da Câmara e do Senado.

A chapa está esquentando.

Bandinha do Jornal da CBN 1ª Edição

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

A economia e a política dos banqueiros Serra e Lula

Carlos Alberto Sardenberg

Do ponto de vista econômico, a compra da Nossa Caixa pelo Banco do Brasil faz sentido.

No mercado concentrado, a Nossa Caixa não tinha muito futuro. Era um banco de varejo, de agências, mas sem o porte necessário para competir com os grandes. Por outro lado, também não era pequeno o suficiente para ser um banco especializado, um banco de nicho, focado num determinado mercado. Estava atravessado.

Para o Banco do Brasil, que reage ao crescimento dos grandes privados, também é um bom negócio. Amplia a atuação do BB no estado de São Paulo, ponto importante. Além disso, a Nossa Caixa vem com duas fontes de renda expressivas: a folha de pagamento do governo paulista, os programas do estado e os depósitos judiciais.

Em circunstâncias normais, a folha do governo paulista, por exemplo, teria de ser leiloada. Mas o governador Serra havia entregue à Nossa Caixa, que agora a leva para o BB.

A questão política
O que nos leva para o lado político da história.

O governador Serra sabia que a coisa mais sensata a fazer era vender a Nossa Caixa e usar o dinheiro para investimentos, para construir outros ativos ou mesmo para reduzir endividamento e diminuir o pagamento de juros.

Como vender?
O normal seria uma privatização. Prepara-se o banco com avaliações e consultorias, define-se um preço mínimo e abre o leilão. Possivelmente, a Nossa Caixa cairia nas mãos do Bradesco, Itaú Unibanco ou Santander – e possivelmente por um preço
maior do que foi pago pelo BB.

O BB até poderia entrar na licitação, com as novas regras, mas dificilmente teria a flexibilidade dos privados para entrar na disputa.

Mas a privatização teria forte oposição do sindicato de bancários, controlados pelo PT ou mesmo do próprio PT, que ainda espetariam na conta de Serra as prováveis demissões e fechamento de agências feitas pelo comprador privado.

Agora, como os sindicatos e o PT podem reclamar da venda para o BB, que é do governo do PT? E se o BB entender que precisa demitir e fechar agências, a conta é de Lula, não de Serra. O governador trocou o leilão por um problema político evitado.

Fica a questão: o estado, o contribuinte paulista, teria obtido mais com a venda em leilão?

É possível, mas como nunca se poderá provar…

A versão de Lula
E Lula? Vai acabar fazendo discurso para dizer que está turbinando o BB para enfrentar a banca privada.

Mantega disse que a crise recente mostrou como é importantes ter grandes bancos públicos para intervir no mercado.

É mesmo? O governo americano não tinha nenhum bancão e interveio muito mais. Idem para o governo da Inglaterra.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

1 Ano de Blog


O blog completou ontem um (1) ano no ar.

Foi a experiência mais bem aproveitada que eu mesmo me proporcionei.

Registrar, de alguma maneira, os fatos mais relevantes que acontecera nos últimos doze meses foi uma tarefa difícil, mas muito gratificante.

Muitas vezes, passei (e passo) horas na frente do computador pesquisando e estudando conteúdos, especialmente de política e economia, que são o perfil do blog, para poder assim formar e, posteriormente, publicar minha opinião.

Devo declarar que tudo isso somado às descrenças de algumas pessoas que me criticam, fazem a cada dia meu vocabulário e meu poder anarquista tornar-se mais seletivo e valorizado.
Contudo, uma coisa foi certa: estou, aos poucos, atingindo os altos graus de connhecimento técnico e científico.

Nesse um ano de blog, conheci pessoas inteligentíssimas, como o Carlos Alberto Sardenberg, a Lucia Hippolito, a Mara Luquet e a Míriam Leitão, através dos eventos promovidos pela Rádio CBN, única emissora de rádio presente no meu dia-a-dia.
Falando em CBN, não posso deixar de registrar, aqui, que foi através desse veículo de comunicação que a vontade de aprender mais a cada dia foi conquistada.

O começo do blog deu-se, especificamente, a partir da discussões em torno da CPMF. Desde então, passei a acompanhar continuamente as articulações do governo em Brasília e observar, com mais clareza, os aspectos da economia. Em suma, de lá para cá a necessidade de ficar por dentro da atualidade tornou-se prioridade na minha vida acadêmica.

Atualmente, estou morando no estado do Rio de Janeiro, na cidade de Nova Iguaçu, desde janeiro de 2007.

Potiguar, nascido em São José de Mipibu no Rio Grande do Norte, vim para o Rio para realizar o sonho de estudar Administração de Empresas e fazer pós-graduação em Ciência Política. Aos poucos, os degraus estão se construindo. Graças a Deus!

Tudo o que estou sendo aqui, devo muito a minha irmã, Elizete, que me acolheu e me favorece, na medida do possível, as condições necessárias para o meu desempenho.

Portanto, neste aniversário do blog, agradeço a todos e a todas que, de uma forma ou de outra, já passaram por aqui.

Muito obrigado!

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Por dentro do blog

Hoje, o blog completa um ano de existência.

Isso é muito bom.

Mas, como foi um dia muito corrido, cheio de atividades, não deu nem tempo de escrever alguma coisa, tipo um resumo do que foi esse um ano.

Espero que ao chegar da faculdade, mesmo cansado, tenha condições de escrever algo.

Afinal, o blog está entrando em uma nova fase a partir de agora.

Futuras novidades, podem aguardar.

Até mais!

Aniversário de 1 ano do Blog


segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Perda de Confiança e de Riqueza

Carlos Alberto Sardenberg

--- Os brasileiros e oduro aprendizado de perder na bolsa -

Para se ter uma idéia da importância do crédito para as vendas de automóveis: em dezembro de 2004, o total de crédito concecido aos consumidores para aquisição de veículos era de R$ 38 bilhões em setembro último, bateu R$ 84 bilhões. Mais do que dobrou em menos de quatro anos.
Logo, são importantes aqueles R$ 8 bilhões que o Banco do Brasil e Nossa Caixa prometeram repassar para bancos de montadoras e outras financeiras, para que estas, de sua vez, emprestem para consumidores. O dinheiro representa quase 10% do crédito total.

Vai dar certo?

Depende do grau de confiança dos envolvidos na parte final do negócio.

BB e Nossa Caixa vão emprestar para bancos e financeiras porque o governo decidiu assim. Não foi uma decisão baseada em análise do mercado. Simplesmente, o governo federal e governos paulista (dono da Nossa Caixa) resolveram fazer isso para estimular um setor importante. Tomaram um risco financeiro, mas por uma escolha política.

Agora, dali para a frente, a política não vale mais. Bancos de montadoras e financeiras vão pagar pelo dinheiro do BB e Nossa Caixa. Logo, vão cobrar dos clientes para tomar o risco de conceder o empréstimo. E por certo, vão exigir juros mais altos e prazos mais curtos, além de uma análise rigorosa da ficha do cliente, já que todos os sinais mostram que o país entra em um período de desaceleração. Ou seja, os clientes podem vir a ter dificuldades para pagar as prestações.

Estariam esses bancos e financeiros sendo gananciosos ou, mesmo, impatrióticos?

Não é simples assim. Governantes podem mandar bancos públicos fazerem isso ou aquilo, porque, em termos bem simples, o dinheiro não é deles. Suponha que o negócio dê errado, que BB e Nossa Caixa não recebam de volta o que emprestaram. Isso representará um prejuízo para os acionistas dessas instituições, que são os governos federal e paulista e mais as centenas de milhares de pessoas e fundos privados.

E o que acontecerá com o presidente Lula e o governador Serra, que ordenaram a operação? Considerando os precedentes brasileiros, nada. Ninguém aqui foi para a cadeia por quebrar um banco público. E bancos públicos aqui, inclusive os dois envolvidos nesta história, já foram resgatados com mais dinheiro do contribuinte.

Mas se os bancos e financeiras privadas perdem dinheiro, perdido está. Podem quebrar e mesmo que venham a ser resgatadas pelo governo, os acionistas, os donos, perdem a propriedade que é estatizada ou passada para outro banco.

No outro lado da história, está o comprador do carro e tomador do empréstimo. Ele fará o negócio se os custos couberem no seu bolso e se, mais importante, tiver confiança de que vai manter sua renda e seu emprego pelos próximos meses.

No caso da questão concreta, a relação renda/custo, é só fazer conta. Sabendo-se que os empréstimos estão mais caros, diminui o número de pessoas que podem tomá-los. Há um cálculo, entre os bancos, pelo qual um aumento de R$ 25,00 no valor da prestação exclui nada menos que um milhão de pessoas do universo de tomadores do emprestimo.

No caso da confiança, é sentimento. Claro que a pessoa pode fazer uma análise objetiva de seu futuro na empresa em que trabalha ou do andamento de seu negócio. Mas em cima disso, tem a psicologia, com uma variável enorme de percepções subjetivas a formar, ou não, a confiança no futuro.

Entra aí, claro, todo o noticiário em torno da crise, que tem sido pesado, e os fatos que a pessoa vai observando em torno de suas relações: cortes de gastos ou demissões no trabalho, problemas com familiares e amigos.
E há aqui um outro fator que talvez pela primeira vez tenha um impacto forte nio Brasil: a sensaçao de perda de riqueza com a enorme queda da Bovespa.

De uns anos para cá, aumentou de modo expressivo o número de pessoas que passaram a aplicar suas poupança em ações. A estabilidade macroeconômica e uma série de reformas na legislação ampliaram o mercado de capitais: mais empresas entraram na Bolsa e mais investidores compraram suas ações.

Fundos passaram a aceitar aplicações com muito pouco dinheiro. Regras abriram a possibilidade para que trabalhadores utilizassem parte de seu FGTS na aquisição de Vale e Petrobrás.
O farto noticiário sobre os anos gloriosos das ações fez o resto do serviço.

Agora, todos sentem a perda, pesada. Outro dia, um funcionário do aeroporto de aeroporto de Congonhas me contou sua história: ele e sua mulher haviam utilizado o FGTS para comprar papéis da Vale. Juntos, tinham adquirido algo como 8 mil reais em ações. No auge, chegaram a ter mais de 35 mil.

No momento em que conversávamos, eles tinham 23 mil e sabiam que, se o dinheiro tivesse ficado no FGTS, não teriam mais que 10 mil.

Comentei: então ainda está no lucro.

E o funcionário: é, mas era 35 mil.

A pessoa incorpora aquele dinheiro, passa a ser seu, entra nos planos. De repente some.

Hoje, a maioria dos investidores parece estar pensando que esta crise é um tsunami que vai passar e que a bolsa vai voltar aos 70 mil pontos. Quando perceber que isso, no mínimo, vai demorar muito, vai dar um baita baixo astral.

Isso tem repecussões no consumo e na política, certamente.

Publicado em O Estado de S.Paulo, 17 de novembro de 2008

domingo, 16 de novembro de 2008

Coluna Panorama Econômico 15/11/2008

Míriam Leitão

A favorita

A única mulher que governou o Brasil foi a Princesa Isabel, em interinidades, três anos ao todo, no século XIX. O século XX foi masculino e o atual será o da diversidade. Que a nossa não seja, como na Argentina, uma mulher à sombra do patrocinador. O presidente Lula a indicou e, agora, Dilma Rousseff vai ser exposta ao sol e ao sereno. Suas idéias fiscais e ambientais precisam de atualização.

Os políticos já viviam no ano de 2010 e, com a declaração de Lula na Itália, não voltarão ao tempo presente. Muitas dúvidas cercam a chefe da Casa Civil. Não se sabe se ela sobreviverá à guerra campal no PT; se agüenta uma campanha; se terá o carisma para arrebatar a maioria do eleitorado; quanto de votos o presidente Lula vai transferir. Já se sabe que, lançada, entra na linha de tiro dos rivais internos.

A eleição municipal de 2008 deixou informações curiosas, que embaralham as explicações convencionais sobre a política brasileira. O PT perdeu a eleição e o PSDB também. Nas principais capitais eles não ganharam a prefeitura. O debate sobre quem é mais vitorioso no mundo tucano, se José Serra, se Aécio Neves, é ocioso. Seus candidatos venceram, mas nenhum dos dois prefeitos eleitos é do PSDB. Serra ganhou a guerra interna e fez uma ponte para uma aliança com um partido de direita, que está cadente. O DEM ficou menor e sem São Paulo teria tido uma derrota feia.

Serra participou pouco da campanha; Aécio e o petista Fernando Pimentel quase sufocaram o candidato de tanto patrociná-lo. Precisaram se afastar, no segundo turno, para que ele consolidasse sua dianteira. É como se o eleitor de Belo Horizonte estivesse dizendo aos seus líderes, em castiço mineirês, idioma que domino de berço: “Já sei que “ocês” são “bão” uai, mas quero “conhecê mió” esse candidato “docês, sô!”.

O eleitorado brasileiro disse a Lula que gostava dele, mas não votava em quem ele indicava. No auge da popularidade, com frutos do melhor momento econômico dos seus dois mandatos, Lula não teve o que mandou os jornalistas escreverem: “Escrevam aí, Marta vai ganhar a eleição”. Acumulou outros fiascos como o de Natal. Dilma subiu no palanque de Maria do Rosário, em Porto Alegre, onde tem título eleitoral e iniciou sua carreira pública. Perdeu.

A vitória do PMDB também é cheia de significados. Para quem olha a política de fora, como eu, é intrigante o fato de que o partido que mais bancadas faz no Congresso, e mais prefeitos elege, nunca conseguiu ter um candidato viável para a eleição presidencial, aceitando o papel de coadjuvante — guloso, é verdade — em todos os governos. Sempre no poder; nunca na Presidência. Especialistas dizem que o PMDB, nesta eleição, se firmou como um condomínio de máquinas locais, confirmou sua natureza municipalista e que, controlando mais cidades, tem chance de fazer grandes bancadas na próxima eleição. Seus problemas: não tem um projeto nacional e, sim, uma colcha de retalhos de interesses fisiológicos regionais e nunca uniu o partido em torno de um candidato presidencial.

O cenário político brasileiro é esquisito. A mais nacional das máquinas partidárias não disputa a Presidência e está sempre no poder; os dois partidos que governaram o país nos últimos 14 anos lideram coalizões, mas não administram as principais cidades e não têm as maiores bancadas na Câmara e no Senado. O PT abandonou seu plano econômico — câmaras setoriais, controle de preço, controle de câmbio, protecionismo, não pagamento da dívida externa e auditoria na dívida interna — e adotou a do partido adversário — metas de inflação, câmbio flutuante, Lei de Responsabilidade Fiscal e abertura comercial. Isso pasteurizou as propostas.

Vários partidos menores cresceram nesta eleição e serão disputados na formação das chapas, mas 2010 pode ser parecido com 1989, eleição muito disputada no primeiro turno, com vários candidatos competitivos e muita dispersão de votos. Há duas grandes incógnitas não respondidas: Dilma passará pelo PT? O PSDB vai resolver a eterna guerra Serra-Aécio? Há cenários, não há certezas.

Foi só o presidente ir ao Papa e dizer o que pensa para a guerra em torno de Dilma começar. Ricardo Berzoini lembrou que há um processo interno no partido, a ser respeitado. O capixaba Renato Casagrande (PSB) disse que ela precisa ir para o sereno; Garibaldi Alves disse que ela precisa ir para o sol. No Espírito Santo, quem vai para o sereno e pega vento sul, adoece; no Nordeste, o sol faz carne-seca.

Dilma terá ainda que superar sua inabilidade no debate público e atualizar suas idéias. Na área fiscal, fulminou com o adjetivo “rudimentar” a melhor idéia defendida por seus companheiros, a do déficit zero na época da fartura. Isso permitiria política contra-cíclica agora. Na área ambiental, nunca demonstrou entender de que matéria o futuro será feito. A questão ambiental-climática estará em todas as equações econômicas daqui para a frente. Seu modelo energético resultou em mais estatismo e mais emissão de carbono. Os últimos leilões aprovaram projetos que sujam a matriz energética, quando a faxina já começou em outros países. Mas o pior para qualquer candidato que depende da benção presidencial é que, antes de 2010, haverá 2009: um ano econômico difícil, desafiador, decisivo.