segunda-feira, 31 de maio de 2010

Quanto o Governo toma do trabalhador

Carlos Alberto Sardenberg

Em um salário de 2 mil, o governo leva R$ 837

O Brasil é um país ainda relativamente jovem, com uma imensa força de trabalho. Isso é um bônus, uma vantagem, por exemplo, em relação a países que estão envelhecendo e nos quais a população economicamente ativa está diminuindo. Aqui, temos mais gente para produzir as riquezas. Logo, deve ser prioridade do país facilitar a abertura de postos de trabalho.

Certo?

Antes de responder, considere o seguinte cálculo, referente ao contra-cheque de um trabalhador solteiro, CLT, com carteira assinada, na qual está registrado um salário de R$ 2 mil mensais. O objetivo é verificar quanto a empresa paga efetivamente e quanto o empregado leva para casa, levando-se em consideração apenas dois tipos de impostos, de renda e contribuições para a seguridade social.

Na vida real, a empresa tem custos mais elevados aqui. Mas consideramos apenas esses dois tipos de impostos para fazer a comparação com outros países, conforme os critérios definidos pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Assim, sobre os R$ 2 mil da carteira do empregado brasileiro, a empresa recolhe 20% de INSS e mais 7,8%, assim divididos: 2,5% por conta de Sistema S (Senai, Sesc, etc.) 2,5% para o salário-educação 2% de contribuição para acidentes e doenças do trabalho (RAT) 0,6% para o Sebrae e 0,2% para o Incra (sim, é isso mesmo que o senhor e a senhora estão pensando, a folha de salários financia a reforma agrária).

Portanto, a empresa paga R$ 2 mil, mais R$ 440 para o INSS e mais R$ 156 para o Sistema S, no total de R$ 2.596.

Já o trabalhador desconta direto no contra-cheque mais 11% para o INSS e o imposto de renda, conforme a tabela progressiva. No caso, R$ 2 mil menos R$ 21 de IR e R$ 220 de INSS, ficando com R$ 1.759.

Tudo somado e subtraído, no nosso exemplo, o governo leva nada menos que R$ 837 em cima de um salário de R$ 2 mil. Ou, quase 33% do total pago pela empresa. Essa é a cunha fiscal no salário, de novo considerando apenas os impostos de renda e para a seguridade social. Fazendo os mesmos cálculos para salários mais altos, até R$ 5 mil, a cunha fiscal restrita chega a absurdos 40%.

É muito ou é pouco?

É preciso comparar. A carga aqui é menor do que em países europeus mais desenvolvidos, como Alemanha e França, que chegam 50% de cunha fiscal. O trabalhador leva para casa metade do que a empresa paga.

Mas os nossos 33% a 40% de carga superam, por exemplo, os valores cobrados em outros países igualmente ricos, como Inglaterra, Canadá, Estados Unidos, Suíça, Japão, Austrália e Coréia do Sul (nesta, os impostos sobre o salário são de apenas 20%).

Há mais. Os serviços prestados pelo setor público em todos esses países são superiores aos brasileiros. Por exemplo, o trabalhador na Alemanha, França, Inglaterra ou Canadá não precisa gastar um tostão com saúde. Já no Brasil, além de pagarem o imposto que financia o SUS, cerca de 35 milhões de trabalhadores ainda pagam planos de saúde, custo em geral também descontado no contra-cheque. A maior parte desses planos é co-financiada pelas empresas, de modo que estas também têm esse custo adicional. Comparando: na Inglaterra, apenas 5% dos trabalhadores pagam seguro saúde privado.

Além disso, o professor Hélio Zylberstajn, que preparou os cálculos, afirma que o FGTS deve ser incluído nesse cunha fiscal. É verdade que, em algum momento, o trabalhador leva para casa o dinheiro do Fundo. Por outro lado, trata-se de um pagamento mensal da empresa e que fica, durante certo tempo, como receita do governo, utilizada de diversas maneiras. Incluindo-se o FGTS, a cunha fiscal em um salário de R$ 2 mil sobe para 35%. Em um salário de R$ 4 mil, vai a 39%,.

Tem mais. Ao pagar suas contas e fazer suas compras, o trabalhador morre de novo com impostos elevados, como os 35% mais ou menos que estão no telefone ou na luz.

Finalmente, na nossa conta, não consideramos outros itens pagos pela empresa, como 13º., férias, abonos, licenças, dinheiro ou benefícios que acabam indo para o trabalhador, mas que encarecem a folha salarial.

E então? Parece um país que precisa oferecer empregos formais? Dá para entender por que quase metade da mão de obra está na informalidade?

Os impostos e encargos sobre a folha salarial constituem um dos maiores absurdos da economia brasileira. O ministro Mantega, logo que assumiu, disse que uma de suas metas era reduzir os encargos sobre a folha. Nada fez. Por que é tão difícil?

Por três motivos principais. Primeiro, porque o governo precisa do dinheiro para gastos sempre em expansão, embora nem sempre eficientes. Segundo, porque a arrecadação é muito simples. A empresa deposita direto na conta da Receita. E, terceiro, porque o dinheiro vai para setores de peso político. Exemplo: federações da indústria e do comércio do país afora que recebem os 2,5% do sistema S.

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