quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Quércia admite ser candidato


Coisas da Política - Jornal do Brasil - 18/4/1989


Por Ricardo Noblat:

O Governador Orestes Quércia [São Paulo] finalmente abriu a guarda. Depois de 40 dias de recusas enérgicas em público e em particular, de negativas contundentes que pareciam não admitir retorno, caiu em tentação e concordou em disputar a indicação do PMDB para candidato à sucessão do Presidente José Sarney.

Foi o Governador Pedro Simon, do Rio Grande do Sul, quem arrancou de Quércia o que outros tinham tentado sem sucesso.

No meio da semana passada, Simon se reuniu no Rio de Janeiro com o jornalista Roberto Marinho, dono das Organizações Globo.

Ouviu dele a opinião de que o governador de São Paulo é o único candidato que o PMDB dispõe para ganhar a eleição presidencial.

Simon voou para São Paulo e lá se encontrou com Quércia. Conversaram longamente. Para efeito externo, Quércia saiu do encontro renovando seu apoio à candidatura de Ulysses.

Simon saiu pregando a renúncia coletiva dos atuais aspirantes a candidato pelo PMDB — Ulysses, Waldir Pires, Álvaro Dias e Íris Resende.

A portas fechadas com Simon, Quércia se rendera pouco antes. "Sem a esquerda, caracterizada pelas figuras de Arraes e Waldir, nem que todo o partido venha me pedir de joelhos eu não aceito ser candidato", estipulou o governador de São Paulo. Concordou pela negativa.

Se os Governadores Miguel Arraes [de Pernambuco] e Waldir Pires [da Bahia] decidirem apoiá-lo, Quércia se dispõe a disputar a sucessão pelo PMDB.

Simon exultou com o que Quércia lhe disse. De novo no Rio de Janeiro, para um encontro de governadores patrocinado por Moreira Franco, Simon conferiu a aceitação de alguns dos seus colegas ao nome de Quércia. Os governadores do Ceará, do Rio Grande do Norte e de Goiás aceitaram o nome de Quércia na hora.

O do Rio não se definiu. O de Pernambuco discordou e deixou o encontro pelo meio. "Quiseram me fazer engolir um prato feito", queixou-se Arraes no dia seguinte no Recife.

Arraes é autor de uma frase que não se cansa de repetir: "É melhor perder com Ulysses do que ganhar com Quércia". Com Ulysses, o PMDB poderá conservar o domínio sobre o espaço de centro-esquerda do país, resgatando seu antigo discurso mais afirmativo.

Com Quércia, imagina Arraes, se reproduzirá a mesma aliança de forças políticas que elegeu Tancredo Neves e que deu em Sarney.

Não é sem motivo, segundo Arraes, que o Ministro António Carlos Magalhães [das Comunicações] torce tanto para que Quércia seja o candidato do PMDB a presidente.

No ano passado, quando Otávio Ceccato, então presidente do Banco do Estado de São Paulo, foi acusado de cometer irregularidades, Quércia telefonou para o Ministro.

Fora informado de que o delegado Romeu Tuma, da Polícia Federal, planejava mandar prender Ceccato. António Carlos ligou para Tuma e ordenou que deixasse Ceccato em paz e que não incomodasse o governador de São Paulo.

"Ministro, o senhor está falando em seu nome pessoal ou em nome do presidente?" indagou o delegado. "No seu lugar, eu não procuraria saber", respondeu o ministro. Ceccato não foi preso.

Simon foi fisgado pela idéia de demolir possíveis resistências à candidatura de Quércia. Na última sexta-feira, em Porto Alegre, recepcionou o governador da Bahia e manteve com ele uma conversa a sós.

Convidou-o a compor na condição de vice a chapa a ser encabeçada por Quércia. Waldir Pires recusou o convite. Simon não desistiu. No dia seguinte, recebeu Arraes e propôs o nome de Quércia para candidato.

Arraes retrucou propondo o dele mesmo, Simon. Diante da insistência do governador do Rio Grande do Sul em louvar as qualidades da candidatura de Quércia, Arraes se aborreceu e deu sua palavra final. "O país está à beira da explosão social e vocês só pensam em ser pragmáticos? Não vou atrapalhar o pragmatismo de ninguém. Façam o que quiserem, que eu ficarei em casa.”

Se Arraes ficar em casa, Quércia também ficará.

Quércia não se arriscará a disputar a sucessão de Sarney sem o apoio da esquerda do PMDB representada por Arraes e Waldir.

Para ganhar tempo e ver se será possível atrair os dois, Quércia sugeriu a Simon articular a aprovação pelo Congresso de uma emenda à Constituição que diminua o prazo de desincompatibilização dos governadores para que concorram à eleição presidencial.

O prazo termina no próximo dia 15 de maio. Não mudará.

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Amanhã - Crônica da traição anunciada

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