terça-feira, 16 de março de 2010

A confusão dos royalties

Miriam Leitão

Com ou sem o argumento das Olimpíadas, a proposta de divisão do dinheiro do petróleo é injusta para o Rio de Janeiro. Temos que olhar as origens. Tudo isso foi criado, a participação especial foi criada, o royalty aumentou porque o petróleo tem um sistema de tributação diferente.

O secretário de Fazenda do Rio de Janeiro, Joaquim Levy, me disse o seguinte: se o petróleo pudesse cobrar ICMS (que é o principal imposto estadual) na origem, como todos os outros produtos, o carro de São Paulo, a carne do Rio Grande do Sul, o Rio de Janeiro recolheria R$ 7,5 bilhões. Mas não pode cobrar. O imposto sai do consumidor.

Da maneira como está, todos os estados se beneficiam do petróleo e da circulação dos derivados de petróleo, porque é cobrado no estado consumidor. São Paulo, o maior consumidor dos derivados de petróleo, é o que mais ganha com isso.

A emenda Ibsen é demagógica. Diz que o Piauí, que estava excluído, vai ganhar. Ninguém estava excluído, porque todos os estados podem cobrar ICMS no consumo do petróleo e o Rio de Janeiro não pode cobrar na origem, como em todos os outros produtos.

Fora isso, há quebra de contrato, há muita coisa errada nessa emenda, que cria uma crise federativa. Hoje, está todo mundo brigando por isso. O deputado Ibsen produziu isso, mas houve principalmente falta de liderança do presidente Lula na condução desse processo. Ele não pode se omitir quando os estados estão brigando.

Não adianta convocar passeata. Desde o começo, o governador do Rio, Sérgio Cabral, deveria ter negociado, convencido a opinião pública de que o Rio não está sendo injusto ao ficar com os royalties. Acho que isso está mal explicado. Sinto pelos e-mails de pessoas de outros estados, que desconhecem algumas coisas importantes a respeito do petróleo.

O Rio de Janeiro não pode cobrar o imposto mais importante do produto, o ICMS, porque isso é feito no estado que consome. Mas qualquer leite que sai do Rio Grande do Sul, por exemplo, vai ter recolhido lá o imposto. Essa forma de cobrar faz com que todos os estados tenham uma arrecadação importante no consumo dos derivados de petróleo que o Rio de Janeiro não tem.

Se estabelecesse essa cobrança, resolveria o problema, porque é mais do que o estado consegue hoje com os royalties, mas os outros perderiam muito dinheiro, o que também criaria um grande problema.

Acho que o governador errou desde o começo, porque tinha de ter mantido a briga pelo convencimento. Porque é assim que se organiza uma Federação. Ele também aceitou quando o presidente disse para ele não reclamar, porque resolveria o problema. Abriu mão, com isso, de suas responsabilidades. E criou-se, assim, um conflito federativo esquisito, porque está todo mundo contra o Rio de Janeiro. Há quantos anos não tínhamos uma crise federativa? E, de repente, vai ter passeata na rua contra quem? O Brasil?

A reação do deputado Ibsen Pinheiro, ao propôr o perfume no bode, é deixar a conta para a União. Ela passaria a ressarcir os estados, mas isso cria nova confusão. Tirar da União é também, indiretamente, tirar dos estados, porque ela repassa recursos. Há compromissos de gastos para esse dinheiro dos royalties do petróleo para a preparação das Olimpíadas de 2016.

Isso tudo é uma irresponsabilidade muito grande. O Rio concentra 85% do petróleo. E vamos imaginar se não fosse assim. Em 2008, quando ele foi a US$ 146, o que teria sido do Brasil? O petróleo que é explorado no estado beneficia o país como um todo, porque deixa de importar e, portanto, tem pressão menor na sua balança comercial.

O Brasil deve conversar sobre isso até se chegar a uma solução que deixe todo mundo convencido. O que não pode é um deputado decidir fazer uma emenda demagógica e manipuladora, porque vira para 24 estados que não recebem royalties e oferece esses recursos. E ficam dois contra 24. Não é com o peso da superioridade númerica que se faz uma Federação, mas com o da argumentação justa.

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