Nada trivial
Que chance tem a reforma tributária de ser aprovada este ano? Próxima de zero. É ano eleitoral; em breve, os deputados estarão mais preocupados com as eleições nos municípios decisivos para as suas próprias reeleições em 2010 do que com a agenda legislativa. Mesmo se não fosse o tema complexo que é, as sessões esvaziadas durante grande parte do ano tornariam difícil a aprovação.
O mais urgente agora seria aprovar o Orçamento. O país está no terceiro mês de 2008 e ainda não tem Orçamento. Este ano há um complicador: os recursos só podem ser liberados até julho, por ser ano eleitoral. Depois é preciso enfrentar o nó das MPs que paralisa o Congresso, evitando as soluções “criativas” que estão surgindo, como a de recriar as reedições. Será preciso também contornar a paralisia que sempre decorre dos trabalhos de uma CPI.
A reforma tributária mexe com os interesses mais agudos das unidades da federação, portanto o debate em torno de cada proposta de mudança costuma criar impasses paralisantes.
Logo após a proposta divulgada, o governador petista de Sergipe, Marcelo Deda, mostrou que tinha dúvidas sobre algumas idéias e ceticismo sobre a possibilidade de sua aprovação este ano; o governador de São Paulo disse que teme vários detalhes; políticos do Nordeste estão pedindo manutenção dos benefícios fiscais já concedidos; o Rio de Janeiro quer que o petróleo seja incluído na mesma forma de cobrança do novo ICMS, com 2% no estado de origem; os municípios temem perder receita. Isso sem falar na pressão das centrais sindicais, que fez com que fosse tirada da Proposta de Emenda Constitucional a redução da contribuição patronal para a Previdência. Tudo isso mostra o quanto o processo é complexo.
Quando o assunto é reforma tributária, os interesses dos estados e municípios falam mais alto que a bandeira partidária. É por isso que tanto Deda, do PT, quanto Serra, do PSDB, têm dúvidas sobre a reforma.
A proposta não tem idéias novas. É um corte e cola de outras propostas que, depois de muita discussão, fracassaram. Como a de Germano Rigotto. As idéias são sempre as mesmas: transformar as 27 legislações do ICMS em apenas uma; reduzir o número de alíquotas desse imposto estadual; cobrá-lo no destino e não na origem; juntar alguns impostos federais num IVA; extinguir contribuições; desonerar investimentos.
Já houve idéias mais ousadas, como a de fundir um número muito maior de impostos estaduais, municipais e federais num imposto que ostente o nome de Imposto sobre Valor Agregado mesmo. Ainda assim, se essas idéias consolidadas e atenuadas na atual reforma fossem aprovadas, significariam um avanço, mas os detalhes ainda não estão claros.
Há muitas perguntas no ar: o IVA federal não vai significar um aumento de tributação sobre empresas de serviço? Os municípios não perderão arrecadação? A fórmula criada para o fim das contribuições garante mesmo que a receita da União não vai cair? E, se não cair, não se está vendendo aos estados uma quimera, informando a eles que passarão a compartilhar receitas antes exclusivas da União? O Fundo de Equalização de Receitas de quem perder com a troca da origem-destino é confiável mesmo? Ou será como o fundo de compensação da Lei Kandir? Qual a diferença entre este Fundo de Desenvolvimento Regional e todos os outros fundos de desenvolvimento regional que já existem?
As medidas que entrarão em vigor mais rapidamente — o IVA-F e a unificação da CSLL com o IRPJ — só vão passar a valer dois anos depois da aprovação da reforma. Se ela for aprovada no ano que vem, valerá para o próximo mandato. A mudança do ICMS valerá para o segundo governo após o fim do governo Lula. A redução dos impostos sobre a folha de salários é ainda mais remota, porque primeiro é preciso aprovar a reforma tributária, aí o governo enviará em 90 dias o projeto de lei com a proposta de desoneração. Se o projeto de lei for aprovado no ano que vem, a redução começará também no próximo mandato, mas a um ritmo tal que estará implantada no meio do segundo governo após o fim do atual.
Não está claro como será o mecanismo de impedir o aumento da carga tributária, que o governo prometeu incluir no projeto. É tão pouco claro sobre isso, quanto sobre a proposta de regulamentar o imposto sobre grandes fortunas. Apenas cita essas intenções, mas não explica como será feito.
Se o governo estiver falando sério sobre o interesse de aprovar a reforma tributária desta vez, ele terá que começar agora a articulação com os governadores para que eles, convencidos de que a reforma é boa, mobilizem suas bancadas para a votação. Quanto mais tempo passar, mais os políticos estarão interessados apenas na eleição municipal. Os partidos da coalizão do governo vão estar juntos a nível federal, mas serão concorrentes na maioria das vezes nas prefeituras. Tudo isso complicará o diálogo este ano.
Se houver alguma negociação séria e bem informada sobre os conflitos federativos, a proposta pode ser até melhorada. Se não souber negociar, o governo terá, ao final do processo, uma soma de vetos a cada uma das idéias, o que a tornará ainda mais fraca. Negociar uma reforma tributária numa república federativa e com tantos vícios e erros na estrutura de impostos é tarefa bem menos trivial do que está sendo apresentado pelo governo.
Que chance tem a reforma tributária de ser aprovada este ano? Próxima de zero. É ano eleitoral; em breve, os deputados estarão mais preocupados com as eleições nos municípios decisivos para as suas próprias reeleições em 2010 do que com a agenda legislativa. Mesmo se não fosse o tema complexo que é, as sessões esvaziadas durante grande parte do ano tornariam difícil a aprovação.
O mais urgente agora seria aprovar o Orçamento. O país está no terceiro mês de 2008 e ainda não tem Orçamento. Este ano há um complicador: os recursos só podem ser liberados até julho, por ser ano eleitoral. Depois é preciso enfrentar o nó das MPs que paralisa o Congresso, evitando as soluções “criativas” que estão surgindo, como a de recriar as reedições. Será preciso também contornar a paralisia que sempre decorre dos trabalhos de uma CPI.
A reforma tributária mexe com os interesses mais agudos das unidades da federação, portanto o debate em torno de cada proposta de mudança costuma criar impasses paralisantes.
Logo após a proposta divulgada, o governador petista de Sergipe, Marcelo Deda, mostrou que tinha dúvidas sobre algumas idéias e ceticismo sobre a possibilidade de sua aprovação este ano; o governador de São Paulo disse que teme vários detalhes; políticos do Nordeste estão pedindo manutenção dos benefícios fiscais já concedidos; o Rio de Janeiro quer que o petróleo seja incluído na mesma forma de cobrança do novo ICMS, com 2% no estado de origem; os municípios temem perder receita. Isso sem falar na pressão das centrais sindicais, que fez com que fosse tirada da Proposta de Emenda Constitucional a redução da contribuição patronal para a Previdência. Tudo isso mostra o quanto o processo é complexo.
Quando o assunto é reforma tributária, os interesses dos estados e municípios falam mais alto que a bandeira partidária. É por isso que tanto Deda, do PT, quanto Serra, do PSDB, têm dúvidas sobre a reforma.
A proposta não tem idéias novas. É um corte e cola de outras propostas que, depois de muita discussão, fracassaram. Como a de Germano Rigotto. As idéias são sempre as mesmas: transformar as 27 legislações do ICMS em apenas uma; reduzir o número de alíquotas desse imposto estadual; cobrá-lo no destino e não na origem; juntar alguns impostos federais num IVA; extinguir contribuições; desonerar investimentos.
Já houve idéias mais ousadas, como a de fundir um número muito maior de impostos estaduais, municipais e federais num imposto que ostente o nome de Imposto sobre Valor Agregado mesmo. Ainda assim, se essas idéias consolidadas e atenuadas na atual reforma fossem aprovadas, significariam um avanço, mas os detalhes ainda não estão claros.
Há muitas perguntas no ar: o IVA federal não vai significar um aumento de tributação sobre empresas de serviço? Os municípios não perderão arrecadação? A fórmula criada para o fim das contribuições garante mesmo que a receita da União não vai cair? E, se não cair, não se está vendendo aos estados uma quimera, informando a eles que passarão a compartilhar receitas antes exclusivas da União? O Fundo de Equalização de Receitas de quem perder com a troca da origem-destino é confiável mesmo? Ou será como o fundo de compensação da Lei Kandir? Qual a diferença entre este Fundo de Desenvolvimento Regional e todos os outros fundos de desenvolvimento regional que já existem?
As medidas que entrarão em vigor mais rapidamente — o IVA-F e a unificação da CSLL com o IRPJ — só vão passar a valer dois anos depois da aprovação da reforma. Se ela for aprovada no ano que vem, valerá para o próximo mandato. A mudança do ICMS valerá para o segundo governo após o fim do governo Lula. A redução dos impostos sobre a folha de salários é ainda mais remota, porque primeiro é preciso aprovar a reforma tributária, aí o governo enviará em 90 dias o projeto de lei com a proposta de desoneração. Se o projeto de lei for aprovado no ano que vem, a redução começará também no próximo mandato, mas a um ritmo tal que estará implantada no meio do segundo governo após o fim do atual.
Não está claro como será o mecanismo de impedir o aumento da carga tributária, que o governo prometeu incluir no projeto. É tão pouco claro sobre isso, quanto sobre a proposta de regulamentar o imposto sobre grandes fortunas. Apenas cita essas intenções, mas não explica como será feito.
Se o governo estiver falando sério sobre o interesse de aprovar a reforma tributária desta vez, ele terá que começar agora a articulação com os governadores para que eles, convencidos de que a reforma é boa, mobilizem suas bancadas para a votação. Quanto mais tempo passar, mais os políticos estarão interessados apenas na eleição municipal. Os partidos da coalizão do governo vão estar juntos a nível federal, mas serão concorrentes na maioria das vezes nas prefeituras. Tudo isso complicará o diálogo este ano.
Se houver alguma negociação séria e bem informada sobre os conflitos federativos, a proposta pode ser até melhorada. Se não souber negociar, o governo terá, ao final do processo, uma soma de vetos a cada uma das idéias, o que a tornará ainda mais fraca. Negociar uma reforma tributária numa república federativa e com tantos vícios e erros na estrutura de impostos é tarefa bem menos trivial do que está sendo apresentado pelo governo.