A decisão de hoje do Copom tem tudo para ser polêmica; seja ela qual for. Se os juros subirem, aumentará a tensão com a equipe econômica; se não subirem, o mercado dirá que houve interferência política. O Banco Central deu todos os sinais de que os juros vão aumentar, após três anos. A Fazenda já deu todos os sinais de que não gostaria que subissem. O mercado já fechou seu consenso, mas isso é o menos importante.
Os economistas que fazem parte das instituições financeiras gostam de pensar igual. Raramente aceitam divergir. No consenso, há menos riscos, então, mesmo quando há uma análise divergente, eles vão arrumando suas opiniões dependendo do que os outros estão pensando. Poucos são os que mantêm posições realmente independentes. Há um processo de retroalimentação: o Banco Central olha as projeções do mercado, e o mercado muda suas projeções conforme os sinais dados pelo BC, e quem não mudou de posição acaba seguindo a maioria. É por isso que, semana a semana, as previsões de juros no ano estão subindo; são os retardatários engrossando o coro dos que prevêem alta. O gráfico mostra o quanto as expectativas podem variar com o tempo.
A melhor forma, portanto, de discutir esta questão é esquecendo sinais do Banco Central e projeções de mercado, e olhando na direção da economia de fato. Os sinais do BC são de que os juros vão subir mesmo. Talvez 0,25 ponto percentual hoje. A dúvida ainda é quanto tempo vai durar este ciclo de alta e até que nível isso levará as taxas.
Há, realmente, uma pressão inflacionária. No acumulado em 12 meses, o IPCA subiu de 4,4%, em dezembro, para 4,7%, em março. Contudo, isso não pode ser um problema tão grande assim, afinal, a meta é fixada em uma banda. O problema é que a economia está dando vários indícios de aquecimento: três milhões de novos acessos de celulares apenas nos dois primeiros meses do ano, que não é época de aumento; vendas de automóveis crescendo há vários meses. Filas de espera para caminhões.
Só que não é a inflação de preços industriais o que está preocupando, mas, sim, a de alimentos. Existe uma inflação estrutural de alimentos que assusta o mundo e que foi o centro da discussão da reunião do FMI e do Banco Mundial na semana passada. Há, às vezes, aumentos sazonais de preços de alimentos, que ocorrem naturalmente e desaparecem tão rapidamente quanto surgiram, e sempre estão localizados em alguns produtos específicos.
Seja para a alta de alimentos estrutural do mundo — que leva a movimentos de rua no Haiti, à inflação de alimentos de dois dígitos na China, a um acumulado de 11% nesses preços no Brasil —, seja para as oscilações sazonais de preço, os juros podem fazer pouco.
O consumo que está sendo ajudado pelo crédito fácil também não deve ser muito afetado por este provável aumento nos juros. Para os brasileiros, anestesiados por taxas sempre altíssimas, uma elevação pequena não é capaz de convencer ninguém a suspender uma decisão de compra. É possível que os juros bancários subam muito mais por força da crise externa que pela elevação da Selic. Crédito concedido com funding em empréstimos externos tende a ficar mais caro.
Quem é contra o aumento da Selic no Brasil argumenta que os efeitos da alta seriam pequenos, com danos grandes, como o aumento do custo da dívida pública. Curiosamente, um artigo de Martin Feldstein, no “Wall Street Journal” de ontem, usou argumento semelhante — de que os danos potenciais seriam grandes e o benefício pequeno —, mas para defender a alta. Para ele, o maior risco é a inflação e a vantagem de retomar o crescimento é muito pequena.
O problema do Brasil não é que os juros vão subir 0,25 p.p. O problema aqui é por que a economia brasileira nunca consegue viver com taxas de juros parecidas com as do resto do mundo. Em raros momentos, não somos os campeões nesse quesito.
Quatorze anos depois da queda da inflação, o Brasil ainda precisa de juros nominais de mais de 11% para ter uma inflação beirando 5%. Alguns outros países, mesmo tão cheios de problemas econômicos, conseguem ter, por mais tempo, juros menores sem que isso ameace o controle da taxa de inflação.
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