(leia a coluna publicada em O Globo por Míriam Leitão, neste sábado)
As commodities — agrícolas e não agrícolas — finalmente começaram a ceder. As altas dos alimentos e do petróleo vinham aumentando a inflação em todo o mundo. Agora, o petróleo caiu 20% desde o pico; a soja, que subiu 80% em 12 meses, caiu 15% só em agosto. Ainda está instável. Mas ontem o país viu a primeira deflação, ainda que de prévia, do IGP-M. Porém é cedo para achar que o problema passou.
Para o Brasil, a boa notícia é que diminuirá a pressão do aumento internacional dos alimentos na inflação; a ruim é que a balança comercial terá um saldo menor.
Desde o início do ano, em meio ao “rally das commodities”, o economista Fabio Silveira, da RC Consultores, era um dos que insistiam que tamanha alta era injustificável se levados em conta apenas os dados da economia real. Não que ele desmerecesse a força da demanda chinesa e indiana, mas com a maior economia do planeta entrando numa recessão, ou, no mínimo, desacelerando, não fazia sentido tanta alta.
Este ano a média do petróleo vai ficar 67% maior que em 2007. A da soja, 68%; assim como a do milho. O CRB, índice de commodities, subiu 30% de janeiro a julho. Mas isso vem mudando. O milho, que quase dobrou em um ano, agora caiu 13%. O arroz, que subiu no mercado interno 56%, caiu 5,5% este mês e o feijão, que também praticamente dobrou, teve queda de 6%. A história é parecida para as não agrícolas. O ouro, por exemplo, registrou uma alta de 40%, e cai 6%.
— As condições para a queda já estavam desenhadas desde o primeiro semestre. A economia americana já vinha enfraquecendo, e a China acaba sofrendo com isso também. O lado real mostrava problemas. Agora o lado financeiro vai diminuindo suas posições em commodities, pois os investidores temem que os juros subam. Eles estavam abrigados nesses papéis — afirma Fabio.
Contudo só agora as commodities começaram a ceder. A começar pelo petróleo, que chegou a estar acima de US$ 140 e que tem oscilado, mas com tendência de baixa; ontem estava a US$ 112. Essa alta do petróleo, matéria-prima de inúmeros produtos, teve forte impacto nos seus derivados, como material de limpeza, itens para construção civil (PVC), insumos agrícolas. A MB Associados, no seu comentário de conjuntura, deduz que o petróleo mais caro “tem feito um estrago” no PIB dos Estados Unidos. Caso não tivessem acontecido as reduções de gastos em setores relacionados ao petróleo, o PIB americano poderia ter crescido 3,3% em vez de 1,9%.
Na visão de Fabio Silveira, “estamos entrando numa nova realidade”, a qual pode ser percebida já neste segundo semestre. E o que muda?
— Para os países exportadores de commodities, como o Brasil, há um lado ruim. Por exemplo, o saldo da balança comercial em 2009 deve ser menor que o de 2008. Os exportadores estavam compensando o dólar baixo com a alta dos preços, e isso deve deixar de acontecer. Mas não vejo um quadro dramático.
No cenário básico, a média do índice de commodities cairia 10% em 2009. A média da soja, 8%; e a do milho, 2%. Numa visão pessimista, com o PIB americano com queda em torno de 2%, as coisas “se complicariam”: a soja cairia 35% e o milho, 33%.
A MB Associados traz uma boa notícia, que tem impacto direto no preço dos grãos: as lavouras americanas de milho e de soja “têm mostrado excelente potencial de recuperação; e a perspectiva de quebra pode ser descartada até o presente momento”. Isso ajudaria a manter os preços sob controle. O maior risco de alta está nas carnes.
Para Fabio Silveira, a situação é mais confortável para a soja. O preço do milho pode cair menos, por causa da produção de etanol nos EUA.
Voltando ao cenário básico com o qual o economista trabalha, as exportações brasileiras do agronegócio cairiam de US$ 60,5 bilhões para US$ 56 bi. E o saldo do setor sairia de US$ 52 bilhões para US$ 49 bi. Até aí, tudo bem. O problema será caso a queda de preços seja bem mais intensa. Naquele cenário pessimista, o saldo do agronegócio chegaria a US$ 35 bilhões. Se for assim, cairá muito a contribuição do setor agrícola no superávit da balança comercial.
Mas esse é só um lado — o mais complicado, por assim dizer — da queda das cotações das commodities. A boa notícia é que a inflação mundial tende a arrefecer; assim como a brasileira. Para Fabio, já no ano que vem, com essa mudança de tendência no preço internacional dos alimentos, a inflação estará convergindo para a meta. Se assim for, o Banco Central não terá mais que seguir o caminho de aumento dos juros. O crescimento ficará ainda mais apoiado no mercado doméstico e menos no setor externo.
Apesar dessa provável trajetória de queda nos preços, tanto Fabio Silveira quanto a MB Associados compartem da visão de que o cenário não é de uma queda ininterrupta e íngreme nas cotações. “Os estoques dos produtos agrícolas estão baixos e, dado o alto custo de produção, principalmente decorrente dos elevados preços dos fertilizantes, as commodities agrícolas devem se manter em patamares elevados de preços”, diz o texto da MB. Fabio Silveira complementa:
— A tendência é de baixa, mas isso não significa que as commodities vão cair todo dia. Haverá períodos em que elas podem voltar a subir um pouco.
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