Não é tão simples a questão do voto secreto no Congresso.
O voto secreto foi instituído para proteger o eleitor. Mas nos Parlamentos do mundo, sua adoção teve como objetivo proteger o parlamentar contra a tirania do Executivo.
Para os eleitores brasileiros, o voto secreto foi uma das bandeiras dos tenentes durante toda a década de 1920.
Vitoriosa a Revolução de 30, o Código Eleitoral de 32 adotou o voto secreto nas eleições. A partir dali, nunca mais se alterou esta característica do voto dos eleitores brasileiros.
Já no Legislativo, a primeira vez em que o voto secreto aparece é na Constituição de 1934. O Art. 38 diz que o voto será secreto nas eleições e nas deliberações sobre vetos e contas do presidente da República.
Ou seja, confirmava a função do voto secreto como instrumento de proteções o parlamentar contra as pressões do Executivo, garantindo a independência do Legislativo.
(Tendo em vista a acachapante preponderância do Executivo, alguém tem dúvidas de que o parlamentar que derrubar um veto em voz alta começará a sofrer retaliações assim que sair do plenário?
Sem contar que, para anunciar seu voto em alto e bom som e expor-se a todo tipo de crítica, o congressista poderá aumentar muito seu poder de chantagem.)
A Constituição de 1946, votada depois de oito anos de ditadura do Estado Novo, ampliou os casos de uso do voto secreto – mais uma vez, era preciso garantir a independência do Legislativo frente ao Executivo, pois as lembranças da ditadura eram ainda muito fortes.
O voto passou a ser secreto nos casos de autorização para processar parlamentares detidos por flagrante de crime inafiançável (Art. 45, § 2º); para o Senado escolher o procurador-geral da República, ministros do TCU, prefeito do Distrito Federal, membros do Conselho Nacional de Economia e embaixadores em missão permanente (Art. 63, I); para o Congresso julgar os vetos (Art. 70) e as contas (Art. 66, VIII) do presidente da República; para o Congresso aprovar estado de sítio (Art. 211) e suspender imunidades parlamentares durante estado de sítio (Art. 213).
A Constituição de 1967, votada já durante a ditadura, manteve os mesmos usos do voto secreto da Constituição de 46, com exceção da declaração de estado de sítio e da suspensão de imunidades parlamentares durante estado de sítio – esta prerrogativa provavelmente passou para o Alto Comando do Exército.
Finalmente, a Constituição de 1988, votada depois de 21 longos anos de ditadura e durante um governo não eleito pelo povo (governo Sarney), ampliou novamente os casos de uso de voto secreto no Congresso, como forma de defender os parlamentares da tirania do Executivo.
Assim, foram mantidos os casos já previstos – vetos do presidente da República; aprovação de autoridades pelo Senado Federal, e autorização para processar parlamentares presos por flagrante de crime inafiançável.
Mas a Constituição determinou que cassação de mandato de parlamentares passasse a ser por voto secreto (Art. 57, § 2º).
É justamente aí que reside o ponto mais polêmico. Quando decide um processo de impeachment contra o presidente da República, a Lei nº 1.079, de 10.04.1950, que regula o processo de impeachment, não fala em voto secreto.
Assim, não parece justo que, para apear o presidente da República o voto seja aberto e para cassar o mandato de um parlamentar, seja secreto.
Lucia Hippolito
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