Enviado por RICARDO AMARAL, repórter especial de ÉPOCA em Brasília.
Começa nesta semana a propaganda eleitoral de uma campanha que promete ser o que o nome diz: municipal. Cerca de 15 mil candidatos a prefeito devem falar muito ao eleitor sobre suas cidades e relativamente pouco sobre temas “nacionais”. Parece óbvio, mas não é comum em nossa democracia. No passado, eleições para vereador foram engolidas pela polarização política originada em Brasília. Isso não deve ocorrer agora – e é uma boa notícia para as eleições e para o futuro das cidades.
Por motivos distintos, nem o Planalto nem a oposição quiseram transformar as eleições municipais num plebiscito ou numa prévia da sucessão presidencial. Ao governo não interessa antecipar o debate de 2010 antes de consolidar o nome do candidato oficial – ou da candidata, como parece ser o caso – e correr o risco de desarrumar, na disputa pelas cidades, a complicada coalizão partidária que o sustenta no Congresso. A oposição nada tem a ganhar nacionalizando o debate eleitoral, num momento em que o presidente Lula desfruta índices recordes de aprovação. Por isso, são raros na paisagem de 2008 os candidatos “de protesto”, assim como as chapas formadas na intenção de esticar até as prefeituras o longo braço do governo federal.
Em 2004, o PT tentou fazer das eleições municipais a plataforma de um ambicioso projeto de poder nacional. Além de errar no objetivo, o comando petista comprometeu-se com a estratégia de comprar aliados entre os partidos médios. O primeiro resultado foi um redondo fracasso político – resumido na vitória, em São Paulo, do tucano José Serra, o adversário batido por Lula na eleição presidencial de 2002. A segunda conseqüência da megalomania petista foi o escândalo do mensalão, que apareceu no estouro da contabilidade clandestina do partido com os parceiros PTB, PL e PP.
Escaldado no desastre de 2004, o presidente Lula barrou as pretensões exclusivistas do PT e obrigou seu partido a aceitar a disputa democrática com os aliados, nas cidades onde os acordos não puderam ser feitos naturalmente. Por isso, há uma dispersão de candidatos de partidos governistas, de norte a sul, e apenas uma vaga expectativa de unidade no segundo turno. No outro extremo, os principais partidos de oposição, PSDB e DEM, apresentaram-se descasados na maioria das grandes cidades, incluindo São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.
Em São Paulo, a candidatura do prefeito Gilberto Kassab (DEM) à reeleição expõe também uma divisão local do PSDB, entre o governador Serra e o candidato do partido, Geraldo Alckmin. No Rio, o PSDB entregou-se em aliança ao candidato do PV, Fernando Gabeira, contra a candidata do DEM, Solange Amaral, apoiada pelo prefeito Cesar Maia. Em Belo Horizonte, o governador tucano Aécio Neves aliou-se ao prefeito petista Fernando Pimentel, ambos apoiando um candidato terceirizado: Marcio Lacerda, do PSB. Ali, o DEM ficou isolado e apresentou um candidato sem chances.
Evidentemente, o mapa político resultante das eleições de outubro vai orientar a corrida presidencial. Mas esse impacto será menos visível que os efeitos sobre as disputas regionais. Geraldo Alckmin é candidato para garantir sua presença na política, provavelmente para tentar voltar ao governo do Estado, embora amigos de Serra vejam aí um obstáculo no caminho do governador rumo ao Planalto. A união de Aécio a Pimentel em Minas favorece as pretensões nacionais do tucano. Mas quem arrisca o próprio futuro é o prefeito petista, que depende da vitória para disputar o governo do Estado em 2010. No Rio, a eleição é uma batalha de Cesar Maia, pela sobrevivência, e do governador Sérgio Cabral (PMDB), pela consolidação de sua força política regional.
Houve momentos em que o debate de problemas gerais, como inflação e desemprego, se impôs e contaminou eleições municipais. Felizmente, é a exceção, não a regra. Por isso, o eleitor tem agora a oportunidade de exigir dos candidatos a prefeito e vereador um debate qualificado sobre as cidades que eles querem administrar nos próximos quatro anos.
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