Pequenas notáveis
(leia a coluna publicada neste sábado, em O Globo)
Um anúncio na "The Economist" desta semana chamava a atenção: era de uma confecção brasileira que teria vencido na competição internacional e virado moda no Vietnã. Essa empresa pode não existir, mas existem 12.000 micro e pequenas companhias do Brasil que já estão no mercado global. No ano passado, juntas, elas exportaram US$ 3 bilhões. A pauta de vendas traz surpresas, como empresas de alta tecnologia.
Em número, as micro e pequenas já são a metade das empresas que vendem para o exterior. Em valor, ainda são bem pouco do total: não chegam a 2%, mas são aguerridas e já aprenderam a trabalhar em outros países. Algumas só conseguem existir por causa de vendas e parcerias internacionais.
A PHD Soft é um caso desses. Ela faz softwares para manutenção de grandes construções, sobretudo as de petróleo. O programa, complexo, prevê possíveis problemas e danos nessas estruturas. Se ela trabalhasse só no Brasil, ficaria refém de um único cliente, a Petrobras. A internacionalização permite que se expanda. No ano passado, mesmo com o câmbio contra, 1/3 das vendas foi para o exterior. Este ano, está fechando parcerias com China e Índia. Já vendeu para os EUA e está em contato com empresas da Inglaterra.
— Agora vemos grandes oportunidades nos Estados Unidos, por exemplo, adaptando nosso software para a manutenção das pontes — comenta Duperron Marangon Ribeiro, hoje diretor da PHD Soft, mas que, na época em que desenvolveu o sistema, era professor universitário. Atualmente, sua empresa tem 38 funcionários.
A maior vitrine deles têm sido as feiras no exterior, onde Duperron conta que viu exemplos interessantes da globalização:
— Acabamos ficando visíveis ao mundo. Recebemos currículos de pessoas de vários países querendo trabalhar conosco, oferecer nosso produto. A Índia oferece a parte de terceirização da produção. Entramos num círculo virtuoso da globalização.
Quem liga para a Consuldent — outra pequena empresa exportadora, que vende consultórios dentários portáteis — é atendido por uma secretária eletrônica em português, inglês e espanhol. Cerca de 1/3 das suas vendas são para o exterior; para países vizinhos, Estados Unidos e Europa, e também a África. Essa proporção já foi maior; houve ano em que mais da metade das vendas foi para fora, contudo, com o dólar baixo, as coisas mudaram um pouco. De qualquer forma, o mercado internacional continua sendo um dos principais focos.
A maleta que serve de consultório foi criada por Miguel de Lima quando ele teve que atender uma paciente em casa. Ela hoje faz sucesso em países africanos, por exemplo, pois, além do preço baixo — a mais barata está em torno de R$ 2.000 — é compacta, o que faz com que possa chegar a áreas mais pobres. A empresa existe desde 2001 e em 2003 passou a exportar pelos Correios. Hoje vende pela internet.
— Nossa facilidade nas vendas vem do preço e da inovação. Tanto que estamos conseguindo competir com concorrentes do Canadá e dos Estados Unidos — diz Miguel de Lima.
Atualmente a empresa tem representantes no exterior, em Portugal e Espanha, mas o forte das vendas são os EUA. Os angolanos têm vindo comprar aqui o produto e o levam de volta no avião.
Uma pesquisa do Sebrae feita com micro e pequenas empresas mostrou que, desde 2000, aumentou muito o volume das que vendem para o exterior. Das entrevistadas, 55% exportaram todos os anos. Mais da metade está interessada em aumentar a importância das exportações nos seus negócios. E os principais entraves listados são, na ordem: o câmbio, a burocracia e a tributação. Os mesmos males que atrapalham as grandes.
Segundo dados do Ministério de Desenvolvimento, no caso das microempresas, metade das vendas vai para Estados Unidos, Argentina e Itália. Em se tratando das pequenas, a metade vai para EUA e Argentina. Para elas, a China ainda está distante.
Um caso um pouco diferente, mas que também tem se valido do comércio global, é o da ONG Onda Solidária, de comércio justo, que assessora costureiras em Petrópolis (RJ). Elas começaram produzindo exclusivamente para vender para a França. As costureiras ganham três vezes o que normalmente é pago e a roupa é feita com algodão ecológico, plantado por 20 famílias de pequenos agricultores do Paraná. Eles desenvolveram a marca "Tudo bom?", e o valor agregado fica por conta do comércio politicamente correto. Quando começaram, em 2004, eram 8 costureiras e 2.000 peças foram exportadas. No ano passado, já foram 40 mil; e as costureiras agora são 30. A comercialização é feita por uma empresa no Nordeste, financiada pelo BID.
Globalizar-se traz muitas vantagens para as micro e pequenas empresas: expansão de mercados, troca de tecnologia. Quando o câmbio não favorece (como é o caso agora), o importante é recorrer à inovação, ou a estratégias que façam do nosso produto interessante para o mundo inteiro. O ideal é não ficar só contando com a venda de matérias-primas. Uma das queixas dos pequenos exportadores é que, para muitos setores, ainda falta ao Brasil uma boa marca país, a qual, sem dúvida, é capaz de abrir portas.
Quanto ao anuncio da "Economist", ele tratava de uma suposta empresa de fundo de quintal do Rio de Janeiro que fabrica camisetas que são sucesso no Vietnã, país com tradição de confecção. Uma blusa vermelha, com a palavra "maneiro", ilustra a propaganda do HSBC. Quem fez o anúncio, a JWT, não conseguiu nos dizer durante a semana se era ou não um fato real. Mas o Brasil está cheio de fatos reais confirmando que micro e pequenas empresas estão achando o caminho do exterior.
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